quarta-feira, 31 de julho de 2013

Da imortalidade

Odeio baratas. Não é novidade.

Por causa do calor, as malditas começaram a aparecer. Não lá em casa, que felizmente o ano passado tivémos a brilhante ideia de chamar um senhor para andar lá a esguichar um spray milagroso (nada de Baygon ou DumDum ou armadilhas do caraças; uma cena industrial, mesmo!), mas no parque de estacionamento e, consequentemente, na entrada do prédio.

A minha vizinha de baixo ainda é mais paranóica do que eu no que toca aos malditos bichos (eu compreendo-te, querida!) e encarregou o marido de espalhar um pó branco na porta de entrada do prédio, na porta de entrada do apartamento deles (está lá uma cagada bem feita! Nem deixou escapar a ombreira da porta. LOL) e em zonas estratégicas do parque.

Segunda-feira à noite cheguei a casa pelas 22:30 e lá estava uma, atrás da porta de entrada do prédio, de barriga para o ar. Comeu o pó, a desgraçada. Anda!
Ontem de manhã saí para trabalhar e ela ainda lá estava. Ao fim do dia, quando cheguei, o mesmo cenário.

Hoje, desci as escadas e nem me lembrei da bicha. Quando fui abrir a porta, olhei para o chão e lá continuava ela. Só que mexia as patas, o demónio! Três dias depois e AQUILO ainda está vivo. Não, não era uma barata diferente. Era a mesma. Estava EXACTAMENTE no mesmo sítio e eu sei que niguém lhe vai tocar até a empregada ir lá limpar as áreas comuns.

WTF? 
Ca nojo!!!!!


terça-feira, 30 de julho de 2013

Competir a escrever #9

À 9ª jornada deram-nos este tema: "Escreva sobre uma das mais difíceis decisões que teve de tomar na sua vida."

A Claudiamar escreveu esta versão tocante.

Eu fiquei-me por um romance soft porn digno de figurar nas páginas centrais da Revista Maria.


Sempre fomos um casal discreto. De poucas saídas e noitadas, apreciadores do nosso sossego e privacidade. Estávamos casados há 4 anos e havíamos namorado uns outros tantos. Conhecíamo-nos de cor, portanto.
Dávamo-nos muito bem com o Paulo e a Ana. Aos fins-de-semana juntávamo-nos sempre em nossa casa ou na deles para jantarmos e passarmos o serão juntos. Também ainda sem filhos, eles haviam optado, contudo, por uma relação mais liberal, sem papéis a servirem de amarras.
Num sábado à noite – um daqueles que nos coubera  – depois de uns copos de tinto a mais, decidimos, qual adolescentes, jogar ao “Verdade ou Consequência”. As coisas começaram a aquecer e, já não me lembro bem como, acabámos os quatro semi-nús na sala. Uma coisa levou a outra e o João começou a acariciar-me ali mesmo em frente aos nossos amigos. Eles perceberam a dica e alinharam. Não tardou e estávamos, ambos os casais, a fazer amor em frente uns aos outros, no tapete, nos sofás…
A iniciativa partiu da Ana. Levantou-se e aproximou-se do João. Fez sinal ao Paulo para vir ter comigo. Fui completamente apanhada de surpresa. Termos sexo juntos era diferente do que trocarmos de parceiros. Não tive mais do que dois segundos para decidir. Ou punha cobro à situação naquele mesmo instante e criava um ambiente de cortar à faca, ou avançava e punha em risco a nossa amizade e, muito provavelmente, o meu casamento.
Fechei os olhos e deixei-me levar. Sentir umas mãos diferentes a percorrer o meu corpo levou-me ao êxtase em poucos minutos. A excitação estava ao rubro. Porém, quando me virei e vi o João em cima da Ana, a beijá-la e a penetrá-la, foi como se tivesse levado um murro no estômago.
“Párem!”, gritei. “Esta palhaçada acabou. Vocês os dois: saiam já daqui!”. Ficaram todos a olhar para mim sem perceber o que tinha despoletado a minha fúria. “Saiam, não ouviram?! Peguem na merda das vossas roupas e desapareçam!”.
Fiquei sozinha com o João. Ele olhava-me incrédulo. Escorriam-me lágrimas pelo rosto e só consegui murmurar: “Não foi preciso dizerem-me nada. Bastou-me olhar para vocês os dois e perceber que esta noite não foi a primeira vez.”. Ele ainda tentou balbuciar qualquer coisa, mas interrompi-o: “Vi a intimidade com que partilharam aquele momento. Há sentimentos por detrás daquela simples queca”. João apenas baixou os olhos. “Tens até amanhã ao fim do dia para saíres desta casa”.


domingo, 28 de julho de 2013

Competir a escrever #8

À 7ª semana, foi este o desafio: "Qual será a cor da revolta? Escreva sobre ela."

A versão da Claudiamar foi esta.

Aqui está a minha:


Hoje escapuli-me à reunião da Mocidade Portuguesa. O meu primo João, que já é Cadete, contou-me que o que nos estão a fazer é uma lavagem cerebral e que as coisas não se passam como nos querem fazer crer. As fotografias que projectam para mostrar as atrocidades que os pretos fazem aos portugueses são, segundo o meu primo, falsas. Diz ele que a gente é que lhes foi roubar a terra e que os nossos soldados, antes de regressarem, matam, mutilam e violam apenas por prazer. Os que não sobrevivem deixam por cá as mães a chorar os filhos, que “foram heróis no Ultramar”. Que ultraje! Quer que o acompanhe a um encontro de jovens, mas em segredo. Cheira-me a sarilhos e rejeito o convite.
Os meus pais não sabem que faltei e os meus colegas Vanguardistas estão demasiado concentrados em folhear aqueles folhetos com imagens de mulheres nuas que o Fernandinho levou a semana passada para darem pela minha falta, como miúdos de 15 anos que são.
Às escondidas, espreito pela porta entreaberta do salão paroquial e escuto, em surdina, a conversa do meu primo João e dos amigos dele. Falam alto, põem-se de pé, esbracejam. Têm o rosto ruborizado e parecem-me exaltados. Acho que se estão a arriscar um bocado, pois se alguém sequer sonhar que estão a pôr em causa o regime, vão meter-se em sérios trabalhos. Podem até ser acusados de conspiração contra a Nação!
Ouço um deles falar em “revolta”. Surgem, aleatoriamente, palavras como “revolução”, “armas”, “cravos”, “Abril”. Sinto-me assustado. Apercebo-me de que há um movimento militar ao qual querem juntar-se, mas contra a nossa própria Pátria. Como podem pensar assim? O que aconteceu aos imperecíveis princípios e valores da civilização cristã que sempre nos foram incutidos? Onde está o sentimento da ordem, o gosto pela disciplina e o culto do dever que nos foram ensinados?
Fecho os olhos por um momento e vejo tudo vermelho. Imagino sangue, pessoas a correr e a cair, gritos e dor. Caio em mim e vejo que o ambiente que se sente naquela sala me foi transmitido. Não estive lá dentro, mas sinto-o. Nasceu em mim uma força, uma revolta. 
Se me perguntarem de que cor é, respondo que não tem. A revolta não tem cor. Não tem cheiro, nem tem sabor. A revolta sente-se. Só o tacto dá por ela, pela tensão no corpo de quem a experimenta.

I'm easy like sunday morning


Acorda, come, vai à net, dorme.
Acorda, come, vai à net, dorme.
Again.
Em modo repeat.




segunda-feira, 22 de julho de 2013

Competir a escrever #7

Na 6ª jornada do Campeonato Nacional de Escrita Criativa foi-nos proposto o seguinte desafio: "Recordar e escrever sobre uma das suas mudanças de casa."

A Claudiamar teve esta abordagem interessantíssima.
Eu saí-me com isto:



O meu pai estava na tropa quando disse à minha mãe que casariam assim que saísse dali. Disse, não pediu. Não tinham casa e ela não trabalhava, mas naquela altura e na minha terra era esse o curso normal das coisas: eles já namoravam (à janela) há demasiado tempo e ele queria despachar o assunto. Ela, submissa, assentiu. Sempre deixou que fosse ele a decidir tudo.
O meu pai ainda deu metade do último ordenado que recebeu antes de casar aos meus avós e levou de dote um cobertor e uma imagem da Sagrada Família. Tinha conseguido, no último ano, amealhar o suficiente para comprar um frigorífico e um fogão. Já a minha mãe, um bocadinho mais remediada, levou a mobília do quarto de cama e os pais pagaram-lhe a boda.
Receberam como presentes de casamento licoreiras e bomboneiras, copos com as personagens da novela das nove, lençóis e naperons. E foram viver para casa dos meus avós paternos, onde tinham um quarto, o respectivo espaço na cozinha e acesso à casa de banho e às outras divisões comuns. Nos outros quartos estavam os meus avós, os meus tios e os seus dois filhos e, enfiada no sótão, a minha tia mais nova, ainda adolescente.
Quando a vida o permitiu, os meus pais começaram a construir uma casa. Os trabalhos decorriam em função do dinheiro disponível, ou seja, lentamente. Recordo-me de ouvir a minha mãe referir-se àquelas paredes como "a casa nova" e eu experimentava, então, um sentimento bom. Seríamos só nós. Mas olhava para ela e reconhecia-lhe no rosto um semblante pesado e triste.
Da mudança em si, tenho apenas ténues memórias. Recordo um camião em frente à casa dos meus avós e revejo o meu pai e várias outras pessoas sem rosto a atirarem tudo o que era nosso lá para dentro. O meu berço, as minhas bonecas, as nossas roupas atiradas sem qualquer tipo de ordem ou arrumação. E a minha mãe a chorar. O meu pai tinha bebido e decidido que aquele era o dia.
A entrada na "casa nova" não me traz um sorriso aos lábios. Atormentam-me a confusão que ainda visualizo, a embriaguez do meu pai e a mágoa da minha mãe. Naquele dia houve mais do que uma mudança: a realidade a que assisti destroçou o coração e abalou o mundo de uma menina que tinha no pai o seu herói. 


sexta-feira, 19 de julho de 2013

Competir a escrever #6

O tema da quinta jornada: "A beleza chora até morrer. Explore a metáfora."

A original versão da Claudiamar aqui. :) 

A minha:

Raquel queria ser famosa. Modelo ou actriz, tanto lhe fazia. Sonhava aparecer nas revistas, ir a festas, dar entrevistas e ser vista na televisão.
Era uma rapariga bonita, de uma beleza comum, mas singular à sua maneira. Tinha a pele clarinha, os olhos cor de avelã e um cabelo castanho cheio de caracóis que lhe davam tanta personalidade. No seu íntimo, contudo, degladiavam-se essa beleza e a inteligência emocional que guiava os seus passos, a sua forma de estar na vida. A primeira começava a perder a serenidade porque não gostava do que via. E chorava. A segunda, que tentava manter Raquel de pés assentes na terra, pouco a pouco foi perdendo importância perante aquela beleza insatisfeita e que chorava ansiosa e desesperadamente por mudanças. Não conseguiu pôr-lhe travão. Raquel sentiu-se de tal forma afectada pelo insistente e cansativo choro da beleza que perdeu a ligação que tinha com a inteligência emocional. Adormeceu-a.
Começou por pintar o cabelo de loiro, colocar lentes de contacto azuis, ir ao solário pôr-se morena e injectar botox nos lábios. Pouco depois, já a beleza chorava novamente; queria mais. Queria ser única, extraordinária, exótica. E por isso chorava. Raquel colocou implantes de silicone no peito e fez uma lipoaspiração. Inconsolável, a beleza achava que Raquel ainda não fizera o suficiente para poder alcançar o sucesso e continuava a chorar, diária e copiosamente. Raquel fez, então, um lifting facial e uma rinoplastia. A beleza achou pouco e chorou quase até não ter lágrimas. Queria ser admirada, caramba! Fez Raquel submeter-se a mais duas cirurgias ao nariz. Um desastre absoluto. Mais um retoque e o septo nasal poderia colapsar. A beleza ficara devastada!
Uma manhã, Raquel olhou-se ao espelho e viu que não era bonita. Havia sido. Mas sabotara-se a si própria. Vivera a falsa quimera de alcançar a perfeição e a sua beleza morrera. Morrera de tanto chorar. Agora não passava de uma aberração.
"E é por isso que a reencaminho para si, colega. Por mais cirurgias que lhe faça, não conseguirei devolver-lhe a formosura, mas a psicoterapia ainda vai a tempo de controlar o transtorno dismórfico corporal e evitar que ela insista nas operações plásticas. É que a beleza deu lugar à fealdade e facilmente a vida poderá sucumbir perante a morte".

República dos Bananas

Não se alcançou o "acordo de salvação nacional". Nem me parece que os líderes partidários se tenham esforçado para o efeito...
E agora, Senhor Presidente da República?! Mais alguma sugestão? Eleições antecipadas para daqui a 1 ano? E entretanto? Que tal um pontapé no cú do maricas do Portas? Um calduço na cabeça de alho chocho do Coelho? Um abanão no pastel de nata que é o Seguro? Um berro para pôr os "miúdos" em ordem, não?
Merkel: podes avançar. Portugal é vosso.



quinta-feira, 18 de julho de 2013

Ricardo Araújo Pereira a Primeiro Ministro!

Só é pena ser comuna assumido, o gajo. 
Inteligente como poucos e foi cair na ilusão da foice e do martelo... :P 
Porque, de resto, acho que os tinha no sítio para dar uma voltinha a esta situação levemente incómoda que se vive em Portugal...



Quando Vítor Gaspar justificou a queda do investimento em Portugal com a chuva, milhares de alunos do ensino secundário terão festejado. Há um número bastante limitado de boas desculpas para não fazer os trabalhos de casa, e mesmo essas, à força de serem repetidas, têm vindo a perder prestígio. O falecimento dos avós, por exemplo, só pode ser alegado, no máximo, quatro vezes – muito pouco para os 12 anos de escolaridade obrigatória, uma vez que, em média, não permite ao aluno livrar-se de mais do que um trabalho por cada três anos, o que tem sido lamentado por madraços de todos os tempos e lugares.


O aparecimento de uma nova justificação, além do mais com o alto patrocínio do ministro das Finanças, alegrou certamente jovens de todo o país. Sá Carneiro tinha sonhado com um governo, uma maioria e um Presidente, mas o tempo veio a demonstrar que um estadista verdadeiramente ambicioso deve sonhar com um governo, uma maioria, um Presidente e um Anthímio do Azevedo. As condições climáticas têm sido injustificadamente descuradas pela ciência política. Nenhum ministro, por mais hábil que seja, consegue controlar o défice com uma humidade relativa superior a 65 por cento. O desemprego não baixa se a temperatura mínima for sistematicamente inferior a 12 graus. E os juros da dívida sobem com os aguaceiros fortes de noroeste.

Ainda assim, há quem considere que a desculpa apresentada por Vítor Gaspar inaugura um novo tipo estratégia: avançar com a chuva como justificação para o fracasso é uma espécie de política molha-parvos. Mas quem tem dúvidas de que o clima influi decisivamente na governação, visite a enevoada Noruega, que por isso mesmo não passa da cepa torta, e depois compare com o espectacular desenvolvimento económico das soalheiras ilhas de Cabo Verde. Não admira que os povos tropicais se organizem com frequência para, disponibilizando um pouco da sua riqueza, ajudar os pobres países nórdicos, prejudicados pelo clima inclemente.

Faz falta, no entanto, integrar mais claramente o factor meteorológico no discurso político, em especial nas campanhas eleitorais. Terá mais credibilidade o partido cujas promessas tomarem em consideração as variáveis climáticas. “Não cortarei o 13.º mês se o anticiclone dos Açores bloquear as frentes frias”, por exemplo, é uma promessa moderna.


                                                                                                                                         Ricardo Araújo Pereira

Keep Calm

Publicado há pouco pela Claudiamar no Facebook.


Ou então, como ela própria o disse, "liga o Descomplicómetro"! :D

Competir a escrever #5

O desafio da oitava semana era este: Liste sete coisas que poderiam acontecer às más pessoas. Depois escolha uma e explore-a.

A versão da "coisa" pela Claudiamar aqui (divertidíssimo!).

A minha:



Querida Senhora Minha Mãe,

Devo confessar-vos que não era isto que eu tinha em mente quando decidi dedicar a minha vida a Deus. Ser Padre, não foi, para mim, como bem sabeis, um sonho de criança. Pode-se dizer que tardiamente senti o chamamento. Mas do que eu tenho a certeza – e vós sois minha testemunha – é que se acendeu em mim uma chama que me instiga e me impele, até hoje, a tentar ajudar as pessoas, a aproximá-las do Senhor.
Não estou arrependido de ter vindo completar os estudos para Espanha. Estando os Senhores meus Pais e os meus bem-amados irmãos aí em Beja, relembro-me de que ficamos a poucos dias de viagem a cavalo de distância e isso conforta-me a alma e distrai-me a saudade.
Por aqui, a Igreja não é a mesma que aí em casa, minha Mãe. Vejo maldade no seu âmago, Deus me perdoe por escrevê-lo. A Inquisição ganhou tamanho poder, que em vez de se pensar nas missas e nos peregrinos, as prioridades tornaram-se encetar perseguições contra aqueles que negam a fé católica e exterminar o pecado que é negar a supremacia de Roma.
Eu sei, minha Santa Mãe, que o nosso Deus é só um e que quem não O aceita arderá nas chamas do Inferno, mas não consigo deixar de sentir pena dos prevaricadores. Não conteis, por favor, às minhas irmãs o que vos passarei a descrever, pois é de tal forma atroz que, mesmo tratando-se de más pessoas, receio que elas fiquem assustadas. Os que rejeitam Deus, Nosso Pai, e o seu filho consubstanciado, Jesus Cristo, são submetidos a inenarráveis torturas: são presos e encarcerados e, já nas celas, são-lhes arrancadas as unhas das mãos e dos pés, uma a uma; são enforcados; queimados vivos às meias dúzias na mesma fogueira; são amarrados a um aparelho que, sendo rodado com uma manivela, estica-lhes os membros até os partir; já vi tirarem-lhes ambos os olhos com um simples golpe de faca; por vezes, cortam-lhes a cabeça à machadada; outras, infligem-lhes as cinco chagas de Cristo para se esvaírem em sangue até à morte.
A minha cabeça e os meus pares dizem-me que é necessário expurgar estes demónios da Terra, mas o meu coração vacila quando penso que, embora o recusem, são filhos do mesmo Pai que eu. E o cheiro a carne humana queimada é indescritível… horrendo e inesquecível!

              Um abraço saudoso



quarta-feira, 17 de julho de 2013

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Competir a escrever #4

O tema: Um homem perde o bilhete ganhador da lotaria. Explore este enredo.
O texto da minha concorrente Claudiamar aqui. :)
O meu:




Artur jogava € 10 no Euromilhões todas as sextas-feiras. Religiosamente. “Tenho uma chave fixa. A vencedora.”, dizia ele à menina da tabacaria. “E depois gosto de jogar com uns números daqueles que a máquina tira aí à sorte.”
Ela olhava-o de cima a baixo, com pena. Reparava com pormenor no casaco de veludo roçado e no boné do Benfica gasto pelo tempo. Ficava a olhar-lhe os ténis já gastos enquanto a máquina emitia o bilhete. E pensava, em jeito de reprovação, onde raio é que aquela criatura que mal parecia ter o que comer ia buscar € 10 todas as semanas. Ainda por cima para gastar ao jogo.
Estava habituada a ver os mendigos ali das redondezas pedirem uns trocos “para uma sandezinha”, segundo diziam. Desviava-se o mais que podia dos que arrumavam carros em troco de uma moeda de 50 cêntimos, pois sabia que por ali proliferavam seringas, bocados de papel de prata e outras coisas nojentas. Morria de medo daquela gente. Da droga, da pobreza, da sujidade…
O Artur era diferente. Magro, muito alto, aparentando cinquenta e poucos anos. Com roupas e sapatos velhos, mas sempre com um ar lavado. Uma vez chegou a comentar com a colega da tabacaria, enquanto lhe marcava os números: “Já viste como é que ele tem as unhas tão limpas?”. Não lhe conhecia emprego nem família, mas também não o via nos parques de estacionamento como aos outros. Não cheirava a tabaco nem a bebida. Fazia-lhe espécie, o homem.
Num dia chuvoso, sem clientes na loja nem pessoas na rua, entrou o Artur aos gritos: “Ganhei, ganhei! Eu não lhe dizia, menina? Ganhei o primeiro prémio!!!”. Inacreditável… Ele tanto persistira que a sorte acabou mesmo por lhe bater à porta. “Parabéns! Já sabe o que vai fazer com o dinheiro?”, perguntou-lhe ela, ainda meio atordoada com tanta excitação. “Ainda não sei nada. Só sei que tenho que ir a correr contar à minha velhota!”
Meia hora passada, ouve-se uma ambulância; chegam os Bombeiros e a Polícia. Uma multidão junta-se em frente à tabacaria. O Artur jazia numa maca, inconsciente. “Perdeu o bilhete vencedor.”, ouviu alguém dizer. “É claro que lhe deu um fanico a seguir!”. Há um paramédico que pergunta: “Aqui o sem-abrigo tem alguém que o acompanhe até à morgue?”. Sem pensar, acenou com a cabeça e entrou na ambulância. Segurou-lhe a mão direita. Fria. Fechada. Cerrada. Não podia acreditar… 


sexta-feira, 12 de julho de 2013

Competir a escrever #3

Desafio da 2ª jornada: Liste 10 razões para nunca escrever a história da sua vida. Depois escolha uma e explore-a.

O texto da Claudiamar aqui
O meu:



1- Detesto pessoas
2- Elas não percebem isso
3- A minha profissão gera perguntas
4- Odeio consultas gratuitas
5- Gosto da solidão
6- Sozinha não crio histórias
7- Não vou a festas
8- Perco histórias para contar
9- Pessoas sem história não são interessantes
10- Ninguém quer ler um livro sem interesse

Desinteressante é irem sozinhos a uma festa e não conhecerem ninguém senão o anfitrião. Ele apresenta-vos algumas pessoas e tem a infeliz ideia de comentar com elas a vossa profissão, a vossa preferência clubística ou a vossa orientação política. Eis que há uma que acha ter algo em comum convosco - talvez vocês sejam médicos e essa pessoa sofra de artrite reumatóide; ou vocês são psicólogos e ele(a) tem uma amiga que sofre de depressão pós-parto - e não mais vos larga a perna. Se já não conheciam ninguém naquela sala, esqueçam a possibilidade de vir a conviver seja com quem for. 

Após uns agonizantes primeiros 30 minutos, tentam escapar-se. "Vou ali buscar mais um croquete". "Eu também já petiscava mais qualquer coisinha." Esqueçam. 
Finalmente, o anfitrião aproxima-se e pergunta-vos se está tudo bem, se estão a gostar do ambiente... Mal têm tempo de abrir a boca e o outro dispara: "Ó, Fulano! Porque é nunca me disseste que conhecias o Sicrano? Temos mesmo que combinar qualquer coisa um dia destes e levar também o Beltrano!". E vocês limitam-se a sorrir. Um sorriso bem amarelinho...

Assim que os primeiros convidados começam a sair, vocês sacam do infalível trunfo da súbita dor de cabeça. Desenganem-se se acham que vai ser assim tão fácil. Primeiro, dir-vos-á que também lhe dói a cabeça e depois vai fazer o relato pormenorizado do seu historial médico.

Por milagre de Jesus Cristo, pede-vos licença para ir "mudar a água às azeitonas". Mais valia ter dito logo "mijar". Seria menos irritante. Mais neandertal, mas menos irritante. Vocês aproveitam a oportunidade e saem de fininho sem sequer chegarem a despedir-se do dono da casa. 

Acabam a noite a maldizer a vossa (des)aventura e prometem a si próprios que da próxima vez que encontrarem alguém assim serão mais assertivos! Até esbarrarem no dia seguinte com a dita criatura à saída do hipermercado e ela vos convidar para um "cafezinho rápido" porque, já que estão ali, quer aproveitar para vos fazer uma perguntinha...

Interessante...? A minha vida NÃO dava um livro.


quarta-feira, 10 de julho de 2013

A ver se gostavas!


Competir a escrever #2

Ainda sobre o Campeonato de Escrita Criativa...
Deixo-vos o texto com que concorri na 3ª jornada/semana.
Não se esqueçam de ir ler o da Claudiamar!

O tema: "Vista a pele de uma colher que está dentro de uma máquina de lavar loiça."

A "obra":


Bem dizia a Senhora Dona Claudete que o seu maior desgosto era nunca ter tido uma filha. Que as suas pratas e os seus serviços de porcelana haviam de ir parar às mãos das destrambelhadas das noras, que não lhes saberiam dar uso.

E a prova disso é que aqui estou eu, dentro de um aparelho que nunca tinha visto antes, mas que, ao que parece, é uma tal de máquina de lavar loiça. Sei-o porque ouvi a nora da Senhora Dona Claudete dizer ao menino Duartinho que “pusesse os pratos e os talheres dentro da máquina”. E aqueles pratos ali ao fundo comentavam que “esperavam que a lavagem corresse melhor desta vez”. Há ali uma colher de pau e uma pá Salazar que se queixam da qualidade do detergente que tem vindo a ser usado. Deixa-as sem brilho, soou-me.

Quer dizer, portanto, que eu, uma colher de servir feita da melhor prata nacional, componente de importância primordial de um faqueiro de 1945, vou ser lavada dentro desta… desta… coisa?! Se a minha Dona Claudete ainda fosse viva, havia logo de impedir o menino Duartinho de cometer tal atrocidade. Sim, porque entre a mulher e a mãe, ele sabia a quem obedecer…

Fui mandada buscar à caixa do faqueiro porque, minutos antes do jantar, a dona da casa reparou que lhe faltavam talheres de servir. Mas que bela anfitriã! Vê-se logo que não aproveitou os ensinamentos de quem sabia receber e lhos quis passar… Lembrou-se de “umas velharias que a sogra lhe tinha deixado” e que “por agora, teriam de servir”. Velharias! Bata na boca, minha menina!

Como se não bastasse a afronta de vir sozinha para a mesa sem o resto do faqueiro (que falta de etiqueta!), enfiou-me dentro do pirex de bacalhau de natas. Eu! Esta colher que já serviu foie gras, magret de canard e outras iguarias nos tempos em que o Senhor Comendador dizia à Dona Claudete que preparasse grandes festas para receberem os amigos!

Passei, portanto, de um objecto de luxo, lavado à mão com o cuidado de quem banha um bebé e polido pela minha rica Maria do Carmo até parecer um espelho (que a Dona Claudete não lhe dava margem para menos), para um qualquer utensílio de cozinha atirado para dentro de um electrodoméstico e preparado para ser lavado em três ciclos com detergente barato e abrilhantador.


terça-feira, 9 de julho de 2013

Competir a escrever

Ora pois que a história reza assim:

Carlinha e Claudiamar decidiram inscrever-se num Campeonato Nacional de Escrita Criativa.
Durante 10 semanas foram-nos propostos temas sobre os quais deveríamos escrever. O objectivo era produzir um texto com não mais de 400 palavras (pesadelo!). 
Escrevia, cortava e recortava e depois lá mandava a produção artística ao respectivo júri.
Uns temas foram parvos, outros mais giros. O engraçado é constatar que, partindo da mesma premissa, as nossas duas cabecinhas produziram sempre histórias tão diferentes umas das outras. :) 

Decidimos, as duas, mostrar-vos o que andámos a fazer nos últimos tempos e a Claudiamar já publicou hoje o seu primeiro texto. Ou melhor, o último. O correspondente à 10ª jornada. Vão lá espreitar.
Agora posto eu o meu aqui. 

O tema era:
"Duas pessoas conhecem-se quando uma delas está à procura de um parente distante. Uma delas é solitária. Explore o enredo."

A minha história foi esta:


- 'Mooor...?
- Hum?
- Sabes aquele campeonato de escrita criativa em que me inscrevi?
- Sim. O que é que tem?
- Este é o último desafio.
- Olha, boa! Não vou mais ter que ouvir os teus textos todas as semanas. (pisca-lhe o olho e lança-lhe um sorriso gozão)
- Bruto!
- Estava a brincar! Sabes que gosto MUITO de ler o que escreves. (tenta abraçá-la, rindo , enquanto ela se finge ofendida)
- Pois, pois...
- A sério! Então o que é que me querias dizer? Estás triste por acabar o concurso, é isso?
- Não. Quer dizer: também. O problema é outro. (começa a roer as unhas) É que não tenho ideias nenhumas para esta semana e isso nunca me aconteceu. O que só vem agravar o facto de ter descido vertiginosamente na classificação... (amuada de frustração)
- Oh! Mas porque é que levas isso tão a sério? Não passa de uma brincadeira. Gostas de escrever e vais-te entretendo. Já não estás no Secundário e não se tratam de notas, certo?
- "Brincadeira"? Desculpa lá! Sabes o que eu penso sobre as competições, não sabes?! QUALQUER competição...
- Então não sei?! Contigo não quero sequer jogar poker a feijões... (revira os olhos e finge ser degolado com o próprio indicador). Mas vá lá, diz. Precisas da minha ajuda, é? (começa em tom de troça, mas trata rapidamente de substituí-lo por uma postura mais séria, não vá o mau-feitio dela dar de si)
- Detesto ter que pedi-la! (orgulhosa!!) Mas estou mesmo sem inspiração...
- Ah ah! Agora é que vais ver como a minha mente é criativa! Diz lá qual é o tema!
- Pára de ser parvo! (irritada) É suposto escrevermos sobre duas pessoas que se conhecem quando uma delas está à procura de um parente distante, sendo que uma é solitária.
- Isso é tão fácil! Escreve um romance qualquer...
- Sim, tipo o "Comer, Rezar e sei lá mais o quê" que me ofereceste, se calhar...! (toda ela é ironia) Tu sabes que detesto histórias de amor e cenas bucólicas...
- Olha, lembras-te daquele programa horrível que costumavas ver na tv em que as pessoas iam à procura dos seus antepassados para construir uma árvore genealógica? Pões um gajo todo giro à caça da identidade do bisavô e uma bibliotecária tímida e solitária a apaixonarem-se e pronto. Voilà!
- Oh! Vai gozar outra!


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